EDP "tranquila" em como não terá de pagar impostos pela venda das barragens à Engie

Elétrica portuguesa entende que negócio foi "transparente, claro" e legal, pelo que não há razão para pagamento do imposto exigido pelo Ministério Público. Por isso mesmo, rejeita constitui provisões.
EDP "tranquila" em como não terá de pagar impostos pela venda das barragens à Engie
FOTO: Gerardo Santos / Global Imagens
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Em dia de apresentação do plano estratégico 2026-2028, a venda de seis barragens em 2020 dominou parte da conferência de imprensa com jornalistas de todo o mundo. Em causa a decisão do Ministério Público sobre o polémico negócio com o consórcio liderado pela Engie, concluindo que não existiu crime fiscal no negócio, mas ordenou à Autoridade Tributária a cobrança de "impostos em falta”, num valor que ascende a 300 milhões de euros.

“A verdade é que ainda não fomos notificados, portanto, sabemos provavelmente tanto como vocês ou eventualmente menos, até porque não temos os documentos. E não consigo comentar uma coisa que não conheço a não ser através dos jornais”, começou por adiantar o CEO da empresa, Miguel Stilwell de Andrade.

No entanto, sublinhou que a posição da EDP “continua a ser aquela que sempre foi: trata-se de uma transação perfeitamente banal, transparente, clara, igual a tantas outras, feitas por tantas outras empresas. Esta é a única estrutura possível para fazer este tipo de transação”, sublinhou.

Por isso mesmo, a EDP não vai constituir, para já, qualquer provisão para precaver uma decisão da Autoridade Tributária sobre esse assunto. "Não, não sentimos necessidade de provisão. Veremos exatamente o conteúdo e hão-de passar os trâmites normais, mas por agora não vemos nenhuma razão para estar a provisionar uma coisa que já se arrasta há alguns anos".

Assim, concluiu o responsável da EDP, a empresa está segura de que nada fez de errado e que não terá de pagar o que o MP contabiliza.

"Estamos perfeitamente tranquilos em relação a isso e achas que uma vez apresentados os facto que não haverá dúvida nenhuma sobre a não necessidade de pagamento de impostos", disse.

Sobre se vai recorrer, Miguel Stilwell não se comprometeu, reafirmando que se tratou de “uma transação perfeitamente transparente, clara e acho que ninguém tem dúvidas sobre isso. Aguardamos obviamente, mas sempre colaborativos com Autoridade Tributária e as várias entidades envolvidas”.

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Grupo EDP vai investir 12 mil milhões de euros entre 2026 e 2028

O inquérito que investigou a venda das centrais da elétrica portuguesa ao consórcio francês liderado pela Engie chegou ao fim no final de outubro.

Em causa está a venda das barragens de Miranda, Bemposta e Picote (centrais de fio de água) e das barragens de Foz Tua, Baixo Sabor e Feiticeiro (centrais de albufeira com bombagem), que a elétrica portuguesa vendeu por 2.200 milhões de euros a um consórcio francês da Movhera, formado pelas empresas Engie (40%), Crédit Agricole Assurances (35%) e Mirova - Grupo Natixis (25%).

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) entendeu que a operação não teve contornos criminais, tendo arquivado as suspeitas da prática de crime de fraude fiscal.

No entanto, o Ministério Público entende que há impostos por pagar e, por isso, segundo a última parte do despacho, a que a Lusa teve acesso, manda a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) “proceder à cobrança dos impostos em falta e que não foram pagos”.

O desfecho do processo foi noticiado esta quarta-feira pelo jornal Expresso, segundo o qual o Ministério Público considerou que a EDP e a Engie não ocultaram às autoridades quaisquer procedimentos e que “não existiu qualquer divergência ou simulação entre o fim declarado e o fim pretendido”. Daí ter afastado as suspeitas de crime.

Apesar disso, a investigação concluiu que a venda implica a entrega ao Estado de impostos que não foram pagos na altura.

Ao todo, o MP calcula que o Estado tem a receber 120,9 milhões em Imposto do Selo, 99,6 milhões de euros em IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) e 114,7 milhões de euros em IRC. Aos 335,2 milhões de euros acrescem juros.

“Para esse efeito, deverá a AT instaurar procedimento administrativo, tendo em vista a liquidação e respetiva cobrança dos tributos em falta”, determina o Ministério Público, explicando que, de acordo com a Lei Geral Tributária (LGT), tendo decorrido um inquérito criminal, o fisco tem agora um ano para realizar esta diligência.

O grupo EDP vendeu as barragens através de uma operação de cisão de ativos e de uma fusão. O negócio foi acordado no final de 2019 e concluído um ano depois, entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021.

Para concretizar a venda, a EDP criou, em 2020, uma empresa chamada Camirengia, para a qual transmitiu a exploração das barragens. Por sua vez, o comprador, o consórcio da Engie, criou em 2019 uma empresa chamada Águas Profundas, que mais tarde viria a mudar o nome para Movhera I – Hidroeléctricas do Norte.

Em janeiro de 2021, a Camirengia fundiu-se com a empresa Movhera, formalizando-se a venda através dessa incorporação. A Camirengia funcionou como sociedade incorporada e a Movhera como sociedade incorporante.

De acordo com o Expresso, apesar de o MP afastar contornos criminais, conclui que a forma como o negócio ocorreu não representou “verdadeiramente de uma operação de reestruturação empresarial”. Por isso, a tributação deve ser calculada desconsiderando a construção realizada.

A AT pode acionar uma cláusula antiabuso, prevista no artigo 38.º da Lei Geral Tributária (LGT), sempre que entender que uma determinada construção jurídica visa gerar uma vantagem fiscal através do “abuso das formas jurídicas”.

É com base nessa norma que o Ministério Público fundamenta a cobrança dos impostos em falta. O negócio investigado pela EDP foi assessorado pelas sociedades de advogados Morais Leitão (do lado da EDP) e Cuatrecasas (do lado da Engie).

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