Exportações agrícolas e alimentares minimizam perdas das indústrias

Automóvel, madeiras e cortiça, têxteis e calçado perderam mais de 790 milhões de euros face ao 1.º semestre de 2023 no comércio internacional. Produtos agrícolas e alimentares ganharam 371 milhões.
A pera rocha é um dos frutos portugueses mais exportados
A pera rocha é um dos frutos portugueses mais exportadosHenriques da Cunha / Global Imagens
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Portugal exportou bens no valor de 40 mil milhões de euros no primeiro semestre, uma quebra de 0,9% o que equivale a menos 375,6 milhões de euros do que em igual período de 2023. Só as vendas ao exterior de indústrias como automóvel, madeiras e cortiça ou têxteis e calçado perderam mais de 790 milhões de euros, compensados por ganhos de 371 milhões de euros nas exportações de produtos agrícolas e alimentares. Os combustíveis minerais também cresceram, contribuindo com 2924 milhões, mais 273 milhões do que no ano passado.

De acordo com os números do comércio internacional ontem divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), as exportações de máquinas e aparelhos e de veículos e outro material de transporte representam um quarto das vendas nacionais ao exterior. E, por isso, a quebra de 3,3% e de 5,4%, respetivamente, nestas categorias de produtos pesam substancialmente no total. Nos primeiros seis meses do ano, Portugal vendeu ao exterior 5901 milhões de euros em máquinas e 5340 milhões em carros e outros veículos, como tratores e aeronaves.

Sendo a Autoeuropa a segunda maior exportadora nacional, a seguir à Petrogal, é de admitir que parte da quebra nas vendas ao exterior da indústria automóvel se prenda com as paragens de produção que a empresa de Palmela fez em junho, e que repetiu depois em julho, embora esta só se virá a refletir nos dados que serão conhecidos em setembro. As paragens, com recurso ao lay-off, deveram-se a uma reestruturação para produção de novos modelos e descarbonização da fábrica.

Um decréscimo que teve repercussões também ao nível dos principais mercados de destino das exportações nacionais, com as vendas ao exterior a crescerem, ou pelo menos a manterem-se estáveis, em sete dos 10 países que integram o top 10 de compradores da economia portuguesa. Espanha manteve-se em linha com o ano passado, com uma variação de 0,2% para 10 316 milhões de euros, mas as exportações para França caíram 7,8% e ficaram-se pelos 5076 milhões. Seguem-se Alemanha, EUA, Reino Unido e Itália, com variações entre os 0,14% dos britânicos e os 11,4% dos norte-americanos.  Em sentido negativo, destaque ainda para os Países Baixos, que estão a cair 7%, e para Angola, que perde mais de 30%.

Dias difíceis para a moda 

Nas indústrias, destaque ainda para as dificuldades dos artigos de moda, impactados pela crise inflacionista que leva os consumidores a comprarem menos. A prová-lo estão as quebras de 15,2% nas exportações de calçado e de 7,8% nas de têxteis e vestuário, para 818,4 milhões de euros e 2841 milhões de euros, respetivamente.

Paulo Gonçalves, porta-voz da APICCAPS, a associação do calçado, admite que se trata de um “cenário preocupante”. "Continuamos a sentir uma grande retração dos mercados, basta ter em conta que, no primeiro semestre, as importações da Alemanha, que é o principal destino das exportações do calçado português, caíram 10%. Sendo as empresas muito dependentes dos mercados externos, a retração do consumo tem uma consequência direta nas suas vendas", diz.

A aposta do setor em novos segmentos de produto, diminuindo a sua dependência do calçado de couro, tem também como resultado prático que o valor global das exportações tenha tendência a descer. A prová-lo está o facto de, em quantidade, a quebra ser de apenas 1,8%, num total de 35 milhões de pares vendidos ao exterior nos primeiros seis meses do ano. "Continuamos a acreditar que o couro é a melhor matéria-prima e que, sendo um produto natural, tem todo o potencial para se continuar a afirmar nos mercados externo, mas não deixamos de ir à procura de alternativas de negócio", sustenta.

Alternativas que passam por investir em novos produtos, mas também em novos mercados e, por isso, a indústria regressa em setembro à Micam, em Itália, a maior e mais relevante feira internacional de calçado, mas terá então já acumulado cerca de 30 iniciativas promocionais no exterior, de que são exemplo a primeira abordagem ao mercado sul-coreano realizada em julho, ou a presença, pela primeira vez, de mais de uma dezena de empresas na Atlanta Shoe Market, nos EUA, de 10 a 12 de agosto. O leste europeu e o médio oriente são outros destinos em vista.

Paulo Gonçalves sublinha ainda que o setor tem "seguido, com muita atenção", os resultados dos seus principais concorrentes, nomeadamente Itália e Espanha, e assegura que o ano tem sido "muito negativo também para eles", o que se traduz num ganho de quota por parte do made in Portugal.

Importante ainda é que, nos dados da fileira, a quebra baixa para 9%, num total de 1050 milhões de euros, fruto de um crescimento homólogo de quase 29% do setor de artigos de pele e marroquinaria, que vendeu já 199 milhões de euros ao exterior, 50 milhões a mais do que no primeiro semestre de 2023

Já o presidente da ATP, a associação têxtil, fala numa “conjuntura global negativa”, com os números a "evidenciarem bem as dificuldades que as empresas estão a atravessar", sobretudo tendo em conta que a comparação é com 2023 que já de si "foi um ano fraco". Mário Jorge Machado fala em "sinais de melhoria, mas pouco evidentes". A única boa notícia é que o problema não é um exclusivo de Portugal, é de todos os países produtores, incluindo os asiáticos.

"Todos se queixam da diminuição da procura por parte das marcas. É uma questão de conjuntura global, não sei se também de algum tipo de mudança estrutural, fruto da vontade do consumidor em ser mais sustentável, ou se é a diminuição do poder de compra resultante deste período inflacionista que está a levar a que gastem menos dinheiro com bens menos urgentes. Será provavelmente uma conjugação de vários fatores", sublinha.

Também na indústria têxtil e do vestuário Portugal ganha quota no mercado europeu. "Bom bom era ganhar quota num mercado em expansão, não num que está em queda, mas Portugal continuar a ser o hotspot para quem quer construir marcas com qualidade e sustentáveis e, nos próximos anos, o país vai ganhar peso na vertente da circularidade, com o início de uma nova fileira nesta área", afiança.

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