José Lopes: "Se tivermos mais slots, baseamos mais três aviões em Lisboa e criamos 100 empregos"

Diretor-geral da easyJet em Portugal assegura que ainda não pagou nenhuma multa por transportar passageiros sem teste negativo. E admite que setor já pediu revogação da lei que castiga companhias.
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A easyJet está presente no mercado português há mais de duas décadas. José Lopes, diretor-geral da low cost em Portugal, assume que a companhia quer crescer mais e reitera que vai lutar pelos slots que a TAP terá de ceder no âmbito da reestruturação aprovada em Bruxelas.

A easyJet é uma das principais companhias a operar em Portugal. O que falta? Passar a voar para os Açores e ter lá uma base?
É um trabalho de muitos anos neste país, um mercado identificado como um que permite um crescimento estratégico para a easyJet. É um dos mercados que temos identificados na Europa como ideal para continuar a crescer e desenvolver novas oportunidades. É isso que vamos continuar a fazer. O que nos falta? Primeiro, falta que passe esta pandemia. A força financeira da easyJet tem sido chave para podermos construir uma plataforma sólida para permitir captura de novas oportunidades. Portugal é uma das oportunidades que temos para investir e crescer num momento em que a procura ainda não está nos níveis pré-pandémicos. Estamos posicionados para começar a crescer, pondo mais capacidade no mercado para que, quando retomar essa procura - que antecipamos que seja a partir de 2023 -, a easyJet em Portugal esteja posicionada de forma mais sólida para poder captar uma maior quota de mercado.

De que forma?
Temos previsto para este ano - que para nós começou em outubro - um crescimento na ordem dos 8%. Esse crescimento será mais acentuado no Porto, onde existem oportunidades porque passou a existir uma capacidade adicional na infraestrutura, e isso vai permitir crescer cerca de 25% no nosso ano fiscal nesse aeroporto. Na Madeira, no Funchal, vamos poder crescer 32%, concretizando uma aposta que é continuar a fazer no doméstico. O país está a duas velocidades: temos o Porto e o Funchal já a reagir em termos de capacidade e que estamos a colocar já de uma forma mais positiva relativamente aos níveis pré-pandémia. E depois Lisboa, que neste momento está em fase de recomeço de alguma retoma.

Vamos olhar para este primeiro semestre. Como está a procura?
Se estivermos a falar do nosso primeiro semestre, que é de outubro até março, vamos estar numa fase ainda de colocação da capacidade mas sem uma reação igual da procura. Esperamos no nosso primeiro trimestre do verão - abril, maio e junho - começar a ver já uma retoma. Esperamos que não surja outra variante que venha complicar esta equação... Portanto, um abril, maio e junho de começo da retoma da procura para que depois, no segundo trimestre do verão, que será o final do nosso ano fiscal, já estejamos perante uma procura similar a níveis pré-pandemia, de 2019.

Os Açores estão fora dos planos?
Neste momento, os Açores não estão na equação porque se mantêm os temas que nos levaram à saída.

Devido à atual variante, tiveram de cancelar muitos voos?
Em Portugal, e na nossa rede em geral, temos conseguido não ter de cancelar voos por problemas com os nossos tripulantes. Felizmente, a forma como tínhamos planeado a operação tem-nos permitido ter a flexibilidade e a agilidade para que os nossos passageiros não sejam afetados por essas dificuldades operacionais. Até agora não tivemos de fazer nenhum tipo de cancelamento por essa razão.

Foram multadas 38 companhias por transportar passageiros sem testes negativo à covid. Quanto é que a easyJet já pagou?
Não foram multadas... A informação que tem sido tornada pública tem que ver com os autos passados pelo SEF ou por outras entidades policiais. Esses autos têm de ser enviados para a ANAC, que depois irá fazer o cross-check dessa informação com as companhias de aviação para ver quais são as razões desses passageiros. Estamos a falar possivelmente de situações em que os passageiros apresentaram testes falsos - e nesse caso é uma responsabilidade apenas do passageiro. Ou de situações, como houve muito em Inglaterra, de passageiros que apresentaram autotestes certificados que eram válidos em Inglaterra e que não foram aceites como válidos, porque não eram certificados da maneira como Portugal exigia. Acreditamos que também existirá alguma margem para não considerar como válidas essas multas porque a pessoa tentou apresentar um teste para certificar que não estava positiva.

Então quantas notificações receberam?
Neste momento, não tenho indicação de concretização de multas. É um processo que ainda levará tempo a ser analisado em concreto e vamos continuar a acompanhar.

A TAP entrou na campanha das legislativas. E de acordo com o plano de reestruturação, vai ter de ceder 18 slots e executar outras medidas. Esperava que a Comissão fosse mais dura?
A easyJet não se opõe à existência de ajudas de Estado. As ajudas de Estado devem existir para situações anómalas e estamos perante a maior crise de sempre da aviação e do turismo. Logicamente, as ajudas de Estado provocam uma distorção no mercado. Também é normal que quando a Comissão permite que existam ajudas estas sejam implementadas com os chamados remédios, que de alguma forma atenuem essa distorção de mercado.

Como a cedência de slots.
Neste caso, a cedência de slots. Foi um processo que acompanhámos, em que tivemos várias discussões com a Comissão e que iremos continuar a acompanhar. Ainda só foi publicada uma nota da Comissão. Ainda não foi publicado o relatório completo sobre o que foi aprovado e ainda não foram publicadas as regras do acesso a esses possíveis slots. Estamos a aguardar, sendo que quer a Comissão quer o governo sabem que a easyJet está interessada em crescer em Lisboa.

Vão envidar esforços para ficar com esses slots?
Quando houver regras, apresentaremos o nosso plano de negócios para tentarmos ganhar esses slots e crescer em Lisboa, apresentando um modelo que compense os utilizadores.

E com o que sabemos do plano aprovado, ficamos ou não com uma TAPzinha?
Do que sabemos, o que poderei dizer é que a easyJet poderá, se conseguir que lhe sejam alocados slots, crescer um pouco mais em Lisboa, baseando mais três aviões, criar ainda mais emprego em Portugal - pelo menos mais cerca de 100 empregos diretos com esses aviões baseados [em Lisboa], que se iriam juntar aos cinco baseados e aos seis não baseados que já temos aqui. A nossa preocupação é continuar a crescer em Portugal e poder fazê-lo finalmente em Lisboa nesta janela de oportunidade, porque não sabemos quando é que irá existir outra.

Se a easyJet ficar com os slots, o que é que isso significa para o turismo?
Se se vier a concretizar, em princípio estamos a falar de 18 slots, que poderão corresponder a três aviões baseados. Cada avião baseado faz normalmente três rotações, portanto estamos a falar de 18 voos por dia que seriam recuperados. O impacto para o turismo é enorme, especialmente porque a easyJet é uma companhia que, além desta questão laboral - geramos emprego local com as regras que existem em Portugal -, transporta passageiros ponto a ponto. Os passageiros ponto a ponto são os que têm um impacto positivo no turismo. São passageiros que vêm do centro da Europa e desembarcam em Portugal, vão para os nossos hotéis, comem nos restaurantes, usam os meios de transporte e fazem mexer a economia.

Uma das questões que vão marcar a aviação é a solução aeroportuária para Lisboa. É possível aumentar a capacidade na Portela?
Pode-se aumentar através de investimento feito pela ANA e pela NAV. O principal problema hoje é de espaço aéreo, não é exclusivamente de infraestrutura. A nível de infraestrutura, que é o que seria mais fácil de implementar, já se começou a fazer alguma coisa. Já se efetuou uma das saídas rápidas, a sua primeira fase está concluída. A ANA deveria acelerar esse processo de investimento. Infelizmente, não foi aproveitado o tempo da pandemia para acelerar os investimentos, quer na infraestrutura quer ao nível de terra pela ANA quer de ar pela NAV. Se tivéssemos cumprido esses desenvolvimentos neste período da pandemia, teria um impacto menor no consumidor. Deve-se acelerar esse investimento, concluindo a segunda fase das saídas rápidas, a extensão do taxiway de Lisboa. Depois, a parte que é importantíssima e que tem que ver com o espaço aéreo: diminuir as distâncias que é possível, implementando aproximações com instrumentação mais moderna que permita subida e descida se calhar mais verticais para que haja um impacto menor na população da cidade. Poderão ser implementadas aproximações que provoquem alguma mitigação desse impacto que existe nas populações que vivem à volta de um aeroporto. Todos esses investimentos têm de aumentar porque, seja qual for a solução que o governo venha a adotar, vai demorar. Depois destas pequenas janelas de oportunidade que temos para trazer alguma capacidade, Lisboa vai outra vez estagnar e só voltaremos a ter capacidade para crescer na segunda metade da década de 2030.

Das três opções, qual é a melhor para a easyJet?
Depende da ótica. Se for numa ótica economicista e temporal, a opção dual com o Montijo é a melhor, porque é a menos onerosa para o país ao nível de custos. Em termos de tempo será a de implementação mais rápida. A que apresenta uma possibilidade de uma solução de raiz, de futuro, é Alcochete.

Para a easyJet, qual é a melhor?
Iremos adaptar-nos a qualquer uma. Logicamente, se nos disserem que o custo da construção do aeroporto vai ser repercutida nos operadores a 100% iremos defender uma solução menos onerosa. Por outro lado, ficamos também numa situação difícil; a easyJet, da mesma maneira que está a operar em Portugal há mais de duas décadas, quer continuar a operar em Portugal nas próximas três, quatro ou cinco décadas, portanto uma solução que daqui a algum tempo venha a estar estagnada não é bom para nós no futuro. Como podemos adaptar-nos a cada uma das situações, colocamo-nos numa posição neutral.

O ministro Pedro Nuno Santos tem dito que a easyJet e a Ryanair não são verdadeiramente concorrentes da TAP porque têm modelos de negócio diferentes. Para a easyJet, a TAP é ou não uma concorrente?
Para a easyJet, a TAP é o nosso principal concorrente. Estamos em concorrência direta com a TAP em praticamente em todas as rotas que operamos.

Nas rotas europeias.
Nas rotas europeias de curto e médio curso e também nas domésticas. Sem dúvida, a TAP é o nosso principal concorrente porque a TAP não vende só longo curso, vende também ponto a ponto - tem menos peso porque também, reconheçamos, a TAP a nível europeu é uma companhia mais pequena do que a easyJet. A easyJet, neste momento, a nível de capacidade, é a segunda maior companhia europeia a nível individual - se não associarmos os vários grupos, a TAP é uma companhia muito pequena a nível europeu, por comparação...

Com uma Lufthansa.
Exato. Se olharmos para o mercado português, Portugal não gera passageiros; apenas 25% dos passageiros totais transportados no país são gerados em Portugal - e aqui incluímos os domésticos. Portanto, 75% dos passageiros que voam são gerados nos outros países. É importante para podermos vencer, dar a conhecer Portugal, sermos fortes nesses mercados. A easyJet é a companhia número 1 no Reino Unido, é a companhia número 1 na Suíça, é a companhia número 2 em França. Esta dimensão europeia nos mercados emissores que geram passageiros é muito importante e é isso que nos tem permitido crescer e ter uma penetração maior do que, por exemplo, todos os nossos concorrentes no país.

O que espera para a aviação do novo governo?
Em primeiro lugar, o aeroporto de Lisboa poder começar a crescer já - já devíamos ter começado isto há anos, independentemente da decisão do novo aeroporto. Em segundo, avançar com a decisão do novo aeroporto. Temos de criar um consenso. Um outro ponto que creio que é importante rever e acabar de uma vez é este tema das multas que estão a ser impostas às companhias aéreas. Esta legislação deveria ser revogada. Achamos que o próximo governo, seja o mesmo ou outro partido, deve rever, olhando para os números de uma forma clara e evidente e baseando-se apenas nos factos; porque se o fizer essa lei será revogada, porque não faz sentido.

Esse pedido foi feito?
Foi.

A nível individual ou coletivo?
Foi feito a nível individual e foi feito a nível coletivo pelas várias companhias de aviação que operam em Portugal.

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