Ao contrário da maioria das pessoas que conheço, não acho que esteja tudo mal em Portugal. Recuso-me a ver o copo sempre vazio e a criticar tudo e todos. Pode ser feitio, pode ser mera defesa, mas considero que "criticar por criticar" é sempre o caminho mais fácil.
Assumo-me como defensora de Portugal. Claro que não é uma defesa cega, todos temos pensamento crítico sobre o que lemos e vemos e todos sabemos os inúmeros problemas no nosso país. Mas os problemas que temos, vamos sempre ter. Não são conjunturais. São históricos. Somos assim, há séculos. Metade do mundo já foi nossa e não a soubemos gerir. E nem estamos assim tão mal.
Vivi e trabalhei 11 anos num dos países mais civilizados e ricos da Europa: o Luxemburgo. Nele tive, também as nossas quatro filhas. Não trocava essa experiência por nada.
Considero-me muito "seguidista" dos bons exemplos, porque quando me deparo com um penso sempre que já não o tenho de inventar, alguém já o fez por mim. No Luxemburgo, tive muitos, a título profissional. As reuniões começam e terminam a horas, têm uma ordem de trabalhos que guia a reunião; as pessoas não se perdem em introduções ou detalhes frívolos que nada trazem à estratégia que se vai debater; as boas ideias são reconhecidas e não invejadas; a hierarquia nas empresas existe mas não é uma obsessão, nem é castradora; não há a cultura de apontar o dedo, há - isso sim - a cultura de buscar soluções e de aprender com os erros de todos. Nada do que é dito num contexto profissional tem cariz pessoal, é sempre objetivo. A maternidade e a paternidade são respeitadas. Há tempo para a família e para o desporto. Não se trabalha a desoras. Não é preciso. Ter reuniões à sexta nem é respeitado, há uma cultura de ser eficiente durante a semana, à sexta já não se resolve nada. Se isto não é qualidade de trabalho, não sei o que seja.
Tive o privilégio de viver e "crescer" profissionalmente com esta realidade numa década muito importante da minha vida, a década dos 30 aos 40. Esta mentalidade ficou gravada em mim, para sempre. Está tatuada no meu ADN profissional. Não me imagino, nem quero trabalhar de outro modo. Voltei há cerca de quatro anos e estou há três a liderar uma empresa multinacional em Portugal. Tenho a veleidade de incutir estes valores e mentalidade às minhas equipas.
Mas nisto, Portugal ainda está atrás. Não somos organizados, nem produtivos. E não tem de ser assim. Os exemplos têm de ser dados pelas lideranças e, as novas gerações, já o reclamam. Seja em empresas familiares ou cotadas, públicas ou privadas.
A pergunta é: então porque voltei? O que tem Portugal que o Luxemburgo não tem? Tudo o resto.
E na Europa rica e civilizada, onde domina a qualidade de trabalho, não fazem a mínima ideia do que seja a "flexibilidade" do jeitinho à Portuguesa, que tão bem nos sabe, que tanta falta me fez, que nos torna flexíveis, criativos, capazes de arranjar soluções para problemas mirabolantes e, em geral - guess what? - fora de horas.....
Mariana Veríssimo, country leader do TMF Group em Portugal