Adivinhações

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A campanha eleitoral foi enfadonha. Como se o apagão tivesse contaminado as direções de campanha, nem uma centelha se viu! Prisioneiros de uma guerra de egos, PS e AD não foram capazes de se libertar da dinâmica suicidária que apenas aproveitou a quem promove o discurso de que “são todos iguais”. Pior, as suas propostas foram resvalando para o populismo e a demagogia de quem oferece tudo a todos, um terreno em que o Chega tem uma indiscutível vantagem competitiva. Quando se julgava que estaria ferido e debilitado pelos sucessivos escândalos, o partido de Ventura foi subindo nas sondagens, à medida que a campanha ia acontecendo. Não podia deixar de ser assim: o Chega é o partido cuja postura reflete o essencial da cultura portuguesa, desde o “olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço” até ao sebastianismo salvífico, passando por encontrar um bode expiatório, pois “a culpa é sempre de outros”. Pouco importa que as suas propostas (?) atirassem o país, de novo, para o abismo das contas públicas descontroladas. Tal como nos EUA, em França, na Alemanha, em Itália os eleitores querem mudança. O caso mais paradigmático é o do Reino Unido: não obstante o Brexit ter vindo a ser um falhanço, o partido de Farage foi o grande vencedor das eleições locais, com base num discurso que atribui a culpa do insucesso aos dois partidos do sistema…

Em Portugal, Ventura cobrará ao vencedor todas as promessas não cumpridas, pouco importando que a irresponsabilidade ficasse, ainda assim, a léguas das dele próprio. A democracia sofrerá mais um rombo, abrindo caminho para o crescimento do extremismo. Não somos originais. Não aprendemos nada com os outros exemplos.

Muito provavelmente, o vencedor das eleições estará na mesma situação que o atual governo. Dois meses depois. O tempo e o mundo, não pararam. E nós?

P.S. Escrevi este texto no dia 5 de maio, após saber que seria publicado no dia 16. Adito-lhe duas notas positivas: algumas propostas da sociedade civil (Causa Pública, por exemplo) e um esforço dos média para clarificar problemas e propostas (é revelador que, em vários casos, o Chega não tenha respondido)

*Alberto Castro é economista e professor universitário

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