O calçado "não vai escapar às pressões inflacionistas" e deverá registar um "forte aumento" de preços, nos próximos seis meses, estimado entre os 5 e 20%. Essa é a convicção de metade dos especialistas ouvidos para o inquérito do World Footwear, projeto da associação portuguesa do calçado que avalia as grandes tendências mundiais do setor. O crescimento médio global apontado é de 8,4%, variando entre um máximo de 9,8% na Europa e um mínimo de 5,7% na América do Norte. O cenário é de otimismo.
"A maioria dos membros do nosso painel acredita que, nos próximos seis meses, a quantidade de calçado vendido vai crescer moderadamente juntamente com os preços, que devem aumentar fortemente. Naturalmente, as perspetivas quanto à evolução dos preços podem estar a refletir o impacto esperado do aumento dos custos de produção. A maioria dos nossos entrevistados também espera que os seus negócios tenham uma saúde "forte" nos próximos meses e que o número de empregos aumente", pode ler-se na 6ª edição do World Footwear Business Conditions Survey, a que o Dinheiro Vivo teve acesso.
Foram 108 as respostas válidas recolhidas, sendo que 48% são de países europeus, 22% da Ásia e 14 e 9% da América do Norte e do Sul, respetivamente. O contributo de especialistas africanos foi de 7% das respostas. Em termos de análise por atividade, metade dos inquiridos estão ligados à indústria (32%) e ao comércio e distribuição de calçado (18%). A outra metade é de associações, consultores e outros especialistas.
O aumento do custo das matérias-primas e das mercadorias é a "principal dificuldade" apontada pelo setor (84%). Seguem-se os problemas com a mão-de-obra, apontados por 40% dos inquiridos, e as dificuldades financeiras (28%). Comparativamente a edições anteriores, destaque para o facto de terem desaparecido das preocupações da indústria a falta de encomendas ou as questões relativas à competitividade. Refira-se que 51% dos inquiridos espera que o nível de emprego no setor cresça nos próximos seis meses, havendo apenas 6% de respostas a apontar para uma quebra.
Quanto ao consumo, as estimativas apontam para um crescimento de 5,9% a nível global, sendo que os dados variam muito de continente para continente: 2,5% de aumento na América do Norte, 5,2% na Europa, 6,8% em África, 7% na América do Sul e 8,9% na Ásia.
CitaçãocitacaoO aumento do custo das matérias-primas e das mercadorias é a "principal dificuldade" apontada pelo setor (84%). Segue-se a falta de mão-de-obra, apontada por 40% dos inquiridos.
Por fim, e no que aos canais de distribuição diz respeito, cerca de dois terços dos especialistas entrevistados acreditam que o e-commerce vai aumentar o seu peso na venda de calçado nos próximos três anos.
Como não podia deixar de ser, o inquérito deste ano incluiu uma pergunta sobre o impacto da guerra da Ucrânia no setor, sendo que mais de dois terços dos inquiridos esperam que o conflito tenha um impacto negativo no negócio. Destes 67%, 13% esperam que esse impacto seja "muito negativo".
"Os dados deste sexto inquérito do World Footwear parecem confirmar os bons indicadores que vamos tendo. Esperava-se que 2022 seria já um ano de recuperação do setor, recuperação que antevíamos que pudesse ser definitivamente consolidada em 2023", refere o diretor de comunicação da APICCAPS. Paulo Gonçalves admite que as previsões dos especialistas é "mais uma mensagem de esperança" para a atividade, mas lembra que é preciso "colocar um certo travão em alguma euforia" que possa existir na fileira, atendendo à guerra na Ucrânia.
"O aumento muito significativo das matérias-primas, de forma direta ou indireta por via da guerra na Ucrânia, influenciará sempre os resultados globais das empresas. Mas não deixa de ser uma boa notícia que se antevê já crescimento do consumo mundial de calçado na ordem dos 6%, o que já é um aumento muito interessante. Mas não podemos esquecer que este é um ano atípico. Começamos com dados muito positivos do comércio internacional, mas o grau de incerteza nesta altura é muito elevado".
Recorde-se que, nos primeiros dois meses do ano, Portugal exportou calçado no valor de 316,6 milhões de euros, um aumento de 22,7% face ao período homólogo e já só 2,5 milhões abaixo de janeiro e fevereiro de 2020 que, em Portugal, foram ainda meses pré-pandemia, com os primeiros casos confirmados a 2 de março.