Retail Investment Strategy: Regulamentação a moldar o futuro do Wealth Management na Europa

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As autoridades europeias preparam-se para adotar regulamentação com potencial para transformar a indústria de Wealth Management (WM), na forma como esta se relaciona e vende produtos ao cliente, e no posicionamento dos players na cadeia de valor do
negócio.

Há uma extensa regulação setorial na atividade da prestação de serviços em mercados e instrumentos financeiros (MIFID II), dos fundos de investimento (UCITS e AIFMD) e dos produtos de investimento através de seguros (IDD, PRIIP e Solvency II), que obrigou a indústria a investir em recursos e tecnologia, na adaptação a regras cada vez mais rígidas.

Não obstante, a União Europeia (UE) considera não existirem condições suficientes para que os investidores de retalho (ou não profissionais) tenham acesso à informação que permita a escolha de produtos e serviços de acordo com as suas preferências e
necessidades, bem como não estarem assegurados mecanismos suficientes de proteção e tratamento adequado por parte de produtores e distribuidores.

A Diretiva Retail Investment Strategy (RIS) procura colmatar estas questões, para que os investidores obtenham um nível de tratamento e proteção similar, independentemente do tipo de produtos e das formas de promoção e distribuição. No entanto, é uma Diretiva que gera desafios à indústria ao promover a convergência de regras entre setores, bem como a aplicação in facto de medidas já existentes. Um outro
desafio resultará dos prazos: a Comissão Europeia (CE) aprovou a Diretiva em maio de 2023; a aprovação pelo Parlamento Europeu e Conselho da UE deverá ocorrer até final de 2024. Após a publicação, os Estados-membros terão 12 meses para a transpor para
a legislação e regulamentação nacional, e 18 meses para a entrada em vigor, isto é, no 1.º semestre de 2026, um prazo ambicioso, considerando a natureza das alterações.

De acordo com a proposta da CE, os mais importantes requisitos e restrições introduzidos pela RIS estão relacionados com conflitos de interesse e os incentivos à
distribuição. Embora não proíba o pagamento de incentivos, a nova Diretiva introduz essa inibição em vendas não objeto de aconselhamento, mantendo a proibição na gestão discricionária e no aconselhamento independente. Quando autorizados, os distribuidores passam a informar os clientes sobre os incentivos e como impactam a rentabilidade do investimento, sendo ainda obrigados a um teste de atuação no interesse dos clientes.

A Diretiva agrava as regras para os produtos, ao reforçar a exigência de análise, pelo distribuidor, da adequabilidade do produto, teste realizado antes da venda e considerando a pertinência da oferta ao portfólio do investidor (uma novidade que colocará desafios da reação do cliente, tratamento de dados pessoais…). Além disto, também introduz ou reforça diversas obrigações ao nível do aconselhamento ao
investidor, obrigando à recomendação apenas do produto financeiro que apresentar a melhor relação custo-benefício.

A RIS ainda aplicará, transversalmente, medidas de análise à relação custo-benefício dos produtos e introduzirá novas regras na formação do preço: por um lado, obrigará à quantificação de todos os custos de produção e de distribuição, bem como do retorno esperado considerando as características do produto; por outro lado, promove a sua comparação, antes da oferta no mercado, com benchmarks de custos e performance desenvolvidos pela ESMA ou pela EIOPA (e inibindo a sua distribuição em caso de uma má relação custo-benefício).

Para o reforço da informação aos investidores de retalho são implementadas medidas como a modernização e adaptação das divulgações à distribuição digital, a informação normalizada sobre custos dos produtos (incluindo pagamentos a terceiros) e a explicação da finalidade e impactos no rendimento esperado, ou o reforço das informações pré-contratuais exigidas nos produtos de investimento com base em
seguros.

Por último, a Diretiva introduz novas regras nas comunicações de marketing, pela imposição de conteúdos equilibrados entre riscos e benefícios dos produtos e a inclusão imediata das suas características. Produtores e distribuidores passam a repartir as responsabilidades sobre os conteúdos e comunicações comerciais, próprias ou de terceiros em seu nome.

No âmbito do processo de aprovação, a RIS encontra-se atualmente em discussão entre o Parlamento Europeu e o Conselho da UE, entidades que proposeram um conjunto diversificado de alterações à versão da CE, entre as quais se destacam a não inibição imediata do pagamento de incentivos aos distribuidores em vendas não objeto de aconselhamento, ou alterações ao nível da utilização de benchmarks nas análises de custo-benefício.

Apesar da fase negocial em curso, os impactos mais relevantes da RIS ocorrerão, provavelmente, ao nível do modelo de negócio dos vários players. Por outro lado, a
Diretiva colocará os distribuidores no centro da mudança na indústria, mas impactará, de forma desproporcional, os produtores.

Professor de Contabilidade Financeira, Contabilidade de Custos, Sistemas de Planeamento e Controlo de Gestão na AESE

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