A saída de quadros da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), sem que tenham sido substituídos, permitiu ao regulador terminar o ano de 2020 com um resultado positivo de 56 mil euros, que compara com 719 mil euros de resultado negativo em 2019.
Os dados foram avançados nesta segunda-feira, no relatório anual da instituição, com a presidente da CMVM, Gabriela Figueiredo Dias, a alertar para crescente pressão nos recursos do regulador, que tem vindo a adquirir novas competências.
"Esta redução de recursos fez-se sobretudo à custa da perda de pessoas e da decisão, durante um período de tempo muito alargado, de não substituição dos recursos que saíram. A pressão que isto cria sobre as nossas equipas - escuso de a descrever - é a que é. É uma pressão muito grande quando se trata de um regulador cujas competências têm vindo a crescer", alertou a responsável na conferência de imprensa de apresentação do relatório.
No ano passado, as despesas da CMVM caíram 5,1%, motivadas pela saída de quadros e também pela redução de benefícios aos colaboradores, ao mesmo tempo que a colocação de pessoal em teletrabalho também terá permitido alguma redução de custos, segundo admitiu a presidente. Já as receitas sofreram uma redução de 1,5%, traduzindo uma quebra de 300 mil euros no valor de taxas de supervisão cobradas, que ficaram ligeiramente acima dos 22 milhões de euros.
No ano passado, a CMVM assumiu a responsabilidade pela supervisão prudencial sobre sociedades gestoras de fundos de investimento e de fundos de titularização de créditos do Banco de Portugal. Tem também, notou a presidente, vindo a assumir mais responsabilidades por força do enquadramento europeu.
Para 2021, entretanto, o regulador tem como prioridades a revisão do regime de gestão de ativos, pretendendo baixar as exigências regulatórias para pequenas gestoras de fundos. A proposta para simplificar autorizações deverá ser entregue até quarta-feira no Ministério das Finanças, revelou Gabriela Figueiredo Dias.
O objetivo é haver um "regime de exigência mínima" para as sociedades gestoras que estão abaixo dos limiares previstos pela diretiva dos gestores de fundos de investimento alternativos (AIFMD) - nos 100 milhões de euros, nos fundos que recorrem a alavancagem, ou até 500 milhões de euros nos que o não fazem.
"A opção regulatória que foi tomada há uns anos pela CMVM e pelo governo nesta matéria foi a de nivelar por cima", explicou, lembrando que a diretiva europeia AIFMD prevê requisitos mais apertados para entidades que representem risco sistémico, com a possibilidade de haver um regime simplificado para as entidades de menor dimensão. "O que estamos a fazer é a reverter esta opção de política regulatória e a assegurar que as sociedades gestoras de ativos de pequena dimensão têm um regime simplificado com requisitos mínimos".
A proposta da CMVM passa também por unificar o regime de gestão de ativos num único diploma, reduzir prazos de atuação e requisitos, assim como a complexidade dos tipos de entidades e fundos atualmente existentes. Ao mesmo tempo, o regulador quer focar-se menos na fiscalização prévia e atuar mais a montante, "privilegiando a responsabilização dos operadores de mercado".
Além da revisão do regime de gestão de ativos que será entregue ao governo, estão já concluídas as propostas para revisão do regime das empresas de investimento e a revisão do regime das obrigações cobertas. Esta última implica igualmente a transferência da competência de aprovação de prospetos de emissões do Banco de Portugal para a CMVM.
O processo, referiu Gabriela Figueiredo Dias, "vai obrigar a uma readaptação da supervisão, formação, conhecimento, e até recursos e conhecimentos que neste momento não existem com estas características tão específicas". "Vai sobrecarregar mais as pessoas? Inevitavelmente", defendeu.
Mas a presidente, cujo mandato está prestes a terminar, defendeu que "as grandes decisões estruturais, que são para o futuro de longo prazo, e que têm a suscetibilidade de produzir alterações e melhorias significativas no mercado não devem ficar prejudicadas por uma questão de recursos das autoridades". "É uma grande responsabilidade. Esperamos estar à altura e esperamos ter as condições para estar à altura".