A contribuição fiscal sobre as embalagens de plástico é apenas mais um saque fiscal e pode até produzir o efeito contrário: aumentar a quantidade de resíduos mais prejudiciais ao ambiente..O Orçamento do Estado para 2021 criou uma taxa no valor de 0,30€ para as embalagens de plástico usadas em takeaway. À primeira vista, a medida tem todos os pontos necessários para ser virtuosa já que todos queremos a redução de plástico. Sobretudo em momentos de pandemia em que todos consumiram mais embalagens e aqueles que puderam optaram por refeições feitas em casa..Na componente ecológica, esta taxa é uma medida cega já que trata todos os plásticos de forma igual, quer seja uma caixa em polipropileno (PP), a mais comum e menos ecológica, uma caixa em polihidroxibutirato (PHB) biodegradável e mais ecológica, ou uma embalagem de cartão que apenas se encontre forrada com uma fina camada de plástico, também com um impacto ecológico mais reduzido. Todas estas embalagens seguem o mesmo caminho e são igualmente tributadas. Ou seja, caixas distintas, com padrões muito diferentes de poluição, têm o mesmo esquema fiscal..A própria Autoridade Tributária já emitiu este esclarecimento e é bastante claro na letra da lei. Assim temos: uma caixa de PP, que custaria 0,05€, passa a custar 0,35€, e uma caixa de PHB, que custaria 0,25€, passa para 0,55€. Para quem não está familiarizado com os tipos de caixas a primeira caixa é mais poluente que a segunda. Porém o padrão fiscal não alterou os termos de troca - assim a mais poluente continua a ser mais atrativa do que a menos poluente. O consumidor vai continuar a preferir a opção mais barata e essa será aquela que é ecologicamente mais onerosa..Não se pode afirmar que esta medida é desenhada a pensar no ambiente. Esta medida é aplicada apenas e só, com vista à obtenção de receita fiscal. Afinal 50% da receita reverte para o Estado e a restante metade, é dividida entre fundo ambiental e outras entidades públicas..Entrando no campo da aplicação da medida, há mais subtilezas. A taxa apenas é aplicada em artigos para consumo fora do estabelecimento que contenham plástico. Esta nuance é muito importante. Se a embalagem não for para levar para casa, não há lugar ao pagamento ao Estado..A "coisa" complica-se se o artigo for usado para dois tipos de consumo. Nesse caso a empresa tem de gerir dois inventários, um com taxa, outro sem..Além disso, cabe ao restaurante informar o fornecedor da finalidade do produto que está a comprar, e só depois de devidamente informado o fornecedor pode ou não cobrar a taxa..Na eventualidade de os recipientes serem adquiridos a outro Estado-membro, fica obrigado a requerer o estatuto de depositário autorizado e criar entreposto fiscal junto da Alfândega..Resumindo, é um inferno para qualquer empresa que tem de gerir mais dois inventários, dois catálogos de venda, dois processos comerciais e dois processos contabilísticos na hora de reportar o valor ao Estado. No final gera-se mais custos de contexto na gestão da operação; custos que extravasam o valor da taxa e acabam a reduzir a produtividade, que já sabemos ser baixa..Não nos fiquemos por aqui. Descendo mais um piso neste inferno burocrático e fiscal, encontramos o apelo à criação de cadeias fechadas de caixas reutilizáveis, uma discussão que sempre existiu, mas que compromete muito a segurança alimentar. Note-se que não se trata de um apelo facilitador. O comerciante, para poder operar neste segmento de embalagens reutilizáveis, tem de cumprir os seguintes passos:.- Implementar um sistema circular de embalagens.- Criar um registo no Sistema de Licenciamento do Ambiente como produtor.- Entregar à Agência Portuguesa do Ambiente um relatório periódico com o número de embalagens em circulação, assim como da sua rotação..Coisa pouca, para um país constituído principalmente por pequenas e médias empresas. No qual, nos quadros de pessoal, constam apenas três funcionários. Esta complexidade por uma embalagem alimentar é apenas mais um encargo entre os muitos que as empresas já suportam..Os empresários passam a maior parte do tempo a reportar ao Estado o que deveriam estar a fazer, caso não perdessem todo este tempo a reportar ao Estado. O resultado é óbvio: a nossa produtividade desce..É, portanto, mais do mesmo..Uma medida que tem como principal objetivo reduzir a quantidade de resíduos plásticos, promover a economia circular e claro, gerar receita fiscal, acaba por não cumprir os seus principais objetivos..Os empresários com mais consciência ambiental, e que fizeram investimentos em embalagens ecológicas, vão perguntar porque é que estão a ser prejudicados..É possível que se crie o efeito contrário, aumenta o risco de contaminações alimentares cruzadas e aumenta a quantidade de resíduos indesejados do ponto de vista ecológico..As empresas têm de se adaptar processos internos, software e recursos humanos, e como não poderia faltar, claro está, será usada mais uma linha no talão de compra com mais uma taxa..A única boa notícia no meio desta confusão de taxas, burocracias, convites indiretos à informalidade, é que esta medida ainda não está a produzir efeitos..O governo deu prazo para escoamento de inventários existentes. Não tenho dúvidas que esta medida assim que se efetivar vai gerar o caos no setor, um setor que sai frágil de uma pandemia e que já carrega consigo outras tantas taxas e burocracias..Vamos todos pagar mais pelo mesmo serviço, trabalhar mais pelo mesmo serviço, o ambiente fica na mesma e atolado de plásticos caríssimos. É uma economia quase circular pois o dinheiro dos contribuintes circula diretamente para os cofres do Estado e não volta.Consultor SAP