A venda de carros usados resiste melhor às crises do que o mercado de veículos novos. E este ano está a confirmar uma frase comum entre os comerciantes do ramo automóvel, tal como aconteceu na crise mundial de 2008 e no período da troika, entre 2011 e 2014..Nos primeiros nove meses do ano, foram importados 42 429 usados ligeiros de passageiros. Trata-se de uma redução de 26,3% na comparação com o período homólogo do ano passado..Bem mais expressiva, porém, foi a diminuição das vendas dos veículos novos (-39,3%, para 105 660 unidades), conforme contas do Dinheiro Vivo a partir dos dados do Instituto Nacional de Estatística e da Associação Automóvel de Portugal (ACAP)..O peso da importação de carros usados face aos automóveis novos atingiu os 40,16% entre janeiro e setembro, mais sete pontos percentuais do que se tinha registado nos primeiros três trimestres do ano passado. Em 2011, por exemplo, os usados valiam 15%..Os clientes particulares são os principais impulsionadores deste mercado. "Com 18 mil euros, compra-se uma carrinha usada de boa qualidade e que custa o mesmo que um veículo citadino novo", explica Nuno Silva, líder da Associação Portuguesa do Comércio Automóvel (APDCA).A fiscalidade é a principal culpada do aumento do peso dos usados, no entender da ACAP. "O veículo novo tem uma grande incorporação de impostos em Portugal, o que não acontece noutros países europeus. Não havendo harmonização, opta-se por comprar um usado importado", lamenta o secretário-geral da associação, Helder Pedro..Os portugueses procuram sobretudo carros das categorias B e C. No ano passado, os veículos a gasóleo valeram mais de metade dos usados (53,22%), enquanto a gasolina ficou com uma quota de mercado de 29,6%. Nos novos, 2019 ficou marcado pela inversão de marcha do gasóleo (40%), ficando atrás da gasolina (49,2%)..Segundo Nuno Silva, "a principal preocupação dos clientes é gastar pouco combustível e pagar pouco IUC", imposto de circulação e que tem uma componente para as emissões de dióxido de carbono e outra para a cilindrada..Na hora de procurar um usado, os portugueses apostam sobretudo em carros com cilindrada de 2000, 1600 e 1500 centímetros cúbicos, normalmente com potência de 110, 90 ou 150 cavalos, de acordo com os dados fornecidos pelo motor de pesquisa Standvirtual..A plataforma portuguesa que liga clientes aos concessionários notou um aumento de 8% nas pesquisas desde o início do ano, em comparação com 2019. Mercedes, BMW, Renault, Peugeot, Volkswagen, Audi, Opel, Citroën, Ford e Nissan são as dez marcas mais procuradas..O forte crescimento do turismo nos últimos anos tornou as empresas de aluguer nas principais compradoras de automóveis em Portugal. Representaram 28% do mercado no ano passado, segundo as estimativas da ACAP. Só que a covid-19 obrigou as rent-a-car a trocar de lugar praticamente de um dia para o outro.."Ainda durante o primeiro período de confinamento, na primavera, todas as empresas procuraram alienar viaturas, com vista a adaptar o melhor possível a oferta à procura", recorda Joaquim Robalo de Almeida, secretário-geral da ARAC, associação que representa estas empresas..Embora o objetivo "nunca tenha sido conseguido", a frota destas empresas caiu praticamente para metade de um ano para o outro: em outubro, havia menos de 50 mil carros disponíveis para alugar; há um ano, esta frota contava com 90 mil unidades em todo o país..Habituada a vender cerca de 20% do parque todos os anos, a Hertz Portugal notou uma aceleração da procura após o primeiro estado de emergência. "O carro pessoal transmite uma maior sensação de segurança", argumenta o líder desta empresa, Duarte Guedes..A quebra da procura nas rent-a-car foi superior a 60% nos últimos três meses a nível nacional. Na região dos Açores, a diminuição do mercado foi de 90%. A tendência é para piorar, devido ao apertar das regras de circulação e deverá levar a nova redução das frotas..O mercado de usados, à conta disto, tem todas as condições para continuar a resistir melhor no ano da pandemia do que o comércio de veículos novos.