Xeque ao Rei

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A comissão parlamentar de inquérito sobre as perdas do Novo Banco teve a virtude de expor à opinião pública a forma como faziam negócios alguns dos nossos empresários mais bem-sucedidos. O que certamente ajudou a criar pressão e facultou elementos para que a justiça atuasse.

Mas a verdade é que nos casos do Joe Berardo e do Luís Filipe Vieira temos crimes que recuam oito, dez anos no tempo e em 2021 a justiça age com uma ferocidade como se agora é que os suspeitos iriam destruir provas ou fugir, quando as suspeitas de que são alvo são públicas há vários anos.

Prende-se para interrogar, solta-se para o jantar. E assim alimenta-se todo um espetáculo mediático que é nocivo à justiça.

Ora, não só a justiça não deveria agir para as televisões, como deveria ser discreta, célere e respeitadora dos direitos dos cidadãos.

Num aspeto é certo que houve uma evolução clara e positiva. Nos últimos anos a justiça perdeu o "respeitinho" ao poder político e económico. É sem duvida uma evolução em relação ao Portugal do século passado. Hoje temos a sensação que não existem intocáveis para a justiça, que todos, independentemente do seu poder, serão investigados e julgados. Mas temos a sensação que o julgamento se faz na fase de inquérito. Temos a sensação de que como não se irá alcançar condenações por falta de provas ou por causa das prescrições, que "eles" levam já com umas noites nos calabouços, pelo sim, pelo não. Fica no ar a existência de justiceiros, em vez da aplicação rigorosa da justiça. O que é perigoso e injusto.

A justiça está a funcionar, é certo. Em áreas em que não se atrevia a entrar antes, é certo. A PJ, o Ministério Público e os Tribunais estão a dar o seu melhor, é certo. Mas nestes grandes casos, de Sócrates, Salgados e amigos, muitas vezes estão a chegar tarde. Não queremos Xeque ao Rei. Queremos celeridade e se for caso disso Xeque-Mate. Não basta parecer que se faz justiça, é preciso mesmo fazê-la. Seja para inocentar a tempo e horas, seja para condenar. Caso contrário é a justiça que corre o risco de ficar em xeque.

Advogado

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