Luxo, desporto e entretenimento: como a Arábia Saudita quer ser o destino número um do Médio Oriente

No encerramento do Tourise 2025, cimeira sobre turismo em Riade, sauditas apresentam novos investimentos que vão desde mega complexo de tiro até voos comerciais para o espaço.
Tourise, realizado em Riade, conta com feira de atrações destinadas à turistas e investidores.
Tourise, realizado em Riade, conta com feira de atrações destinadas à turistas e investidores. DR
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*Em Riade

Hotéis e aviões de luxo, um mega complexo de entretenimento, "o Mundial de futebol mais memorável de todos os tempos" e até voos comerciais para o espaço. Não são pouco ambiciosos os planos da Arábia Saudita para os próximos anos e que ganharam forma com investimentos que entretanto foram anunciados no Tourise 2025, fórum sobre o turismo global que decorreu em Riade, na capital do Reino.

Na última quinta-feira, 13 de novembro, derradeiro dia da cimeira, líderes sauditas e investidores de diferentes partes do mundo anunciaram uma série de novas aplicações de capital no setor do turismo do país, que pretende, muito em breve, ser o destino número um dentre as nações do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG).

Entre os projetos mais emblemáticos está o primeiro grande investimento do Events Investment Fund (EIF), o Fundo de Investimentos de Evento no Reino. O fundo apresentou o Riyadh Shooting Range & Entertainment Complex, um megaempreendimento de mais de 131 milhões de dólares (aproximadamente 113 milhões de euros à taxa de câmbio atual) que ficará na cidade de Qiddiya, conhecida pelo aspecto futurista e eventos de gaming e e-sports, outro mercado no qual os sauditas têm investido fortemente.

A 40 minutos da capital, o complexo ocupará 457 mil metros quadrados, o espaço terá, além das zonas de treino profissional e das arenas para tiro com pistola, rifle e shotgun, um centro de entretenimento completo, com paintball, airsoft, laser tag e experiências digitais. A estimativa dos sauditas é que o empreendimento gere 2.300 empregos e atraia mais de 400 mil visitantes por ano: mais uma peça no puzzle saudita de se tornar referência global na economia dos eventos.

"O Riyadh Shooting Range representa um marco único na trajetória do EIF e é o nosso primeiro projeto emblemático, desenvolvido de acordo com os padrões internacionais de Qiddiya City", disse Wahdan Suliman Alkadi, CEO do EIF", reforçando que empreendimentos como este "estimulam oportunidades de investimento e contribuem para alcançar os objetivos da Visão 2030 da Arábia Saudita".

Infinito e além

A beOnd, promovida como a primeira companhia aérea de “premium leisure” do mundo, foi outra que fez um anúncio de peso no mercado árabe: a empresa confirmou uma nova ronda de investimento de 100 milhões de dólares (cerca de 86,2 milhões de euros) para expandir rotas e operações. A companhia, que opera apenas aviões com lugares totalmente executivos, quer chegar a 56 aeronaves até 2030 e abrir novas bases no Médio Oriente, nos Estados Unidos, Europa e na Índia.

O plano inclui reforçar as ligações entre a Europa e Riade e tornar o Reino um hub regional para viajantes de luxo. Desde o lançamento, em 2023, a beOnd já transportou mais de 20 mil passageiros e consolidou um produto que mistura aviação comercial com a exclusividade da aviação privada. A aposta encaixa no tipo de turismo que a Arábia Saudita quer atrair: viajantes dispostos a gastar mais e que procuram experiências diferentes das habituais.

Foi no entanto, olhando ainda mais longe do que os aviões que sobrevoam Riade, que veio o anúncio mais futurista do Tourise, com a HALO Space a apresentar o início dos seus voos turísticos da capital saudita até à estratosfera.

"Até 2030, mais de mil passageiros terão voado com a HALO, e, até 2035, esperamos receber mais de 15 mil passageiros, permitindo que vivenciem o ‘overview effect’, uma visão transformadora da Terra a partir do espaço", declarou Carlos Mira, CEO da empresa, que, até 2029, pretende operar além da Arábia Saudita, também nos Estados Unidos, Espanha e Austrália.

A empresa pretende levar passageiros a 35 quilómetros de altitude, numa cápsula pressurizada com janelas panorâmicas que permitirá observar a curvatura da Terra e o halo azul atmosférico. Sem motores de foguete, os voos serão impulsionados por um balão de gás e durarão até seis horas, carregando oito passageiros e um piloto. Já foram feitos cinco testes bem-sucedidos e o objetivo é tornar esta experiência - hoje restrita a astronautas - acessível a viajantes ultraluxuosos.

Olhos no Mundial 2034

Outro aspecto que continua a ser uma das vitrines mais importantes para a estratégia saudita é o desporto, atualmente potencializado pela presença de craques como Cristiano Ronaldo e Benzema na liga saudita e na organização de torneios mundiais.

Em painel no Tourise, Abdulaziz bin Turki Al-Faisal, Ministro do Desporto, reforçou este papel dos megaeventos no processo de transformação do país e não poupou ambição ao falar sobre o Mundial FIFA de 2034: "Queremos fazer o Mundial mais memorável de todos os tempos”, disse na sua intervenção.

Durante o painel, o ministro explicou que o impacto desportivo no ecossistema saudita vai muito além da estratégia de trazer público para o Reino. “O Grande Prémio de Fórmula 1 em Jeddah contribui com cerca de 900 milhões para a economia local e gera 20 mil empregos durante o evento”, afirmou. Segundo o mesmo, o país não está “a receber eventos por receber”, mas a criar um legado que modernize a sociedade e prepare as próximas gerações.

Os números apresentados pelo ministro chamaram a atenção do público: de acordo com Al-Faisal, quando a Visão 2030 foi lançada, apenas 13% dos sauditas eram fisicamente ativos. Hoje, o índice chegou a 59%, com programas escolares que envolvem 150 mil crianças no futebol e 50 mil no ténis, além do boom no boxe e na criação de novas federações de 30 para 97 em poucos anos. Tudo isso, diz o ministro, é alimentado pelo calendário crescente de eventos internacionais que o país acolhe.

Por trás de todo esse movimento, que vai desde o entretenimento até ao desporto, está também um aliado tecnológico dos sauditas e que esteve no centro dos debates durante os três dias de evento: a inteligência artificial. O Tourise apresentou o relatório “New Codes of Luxury”, que descreve como a IA deverá transformar a hotelaria de luxo e o atendimento personalizado.

Para o ministro do Turismo, Ahmed Al-Khateeb, o grande rosto da primeira edição da conferência anual, "a IA não é um extra opcional e sim parte essencial do futuro da hospitalidade na Arábia Saudita e em todo mundo”: o país - que já tem a Humain, empresa estatal de IA presidida por Mohammed bin Salman - quer assumir a liderança global também neste domínio. Ambição para os sauditas não falta. Tampouco dinheiro.

nuno.tibirica@dn.pt

*O DN viajou a convite da organização da Tourise 2025
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