Uma das maiores dificuldades dos produtores nacionais prende-se com a escala e a capacidade de diversificar mercados no exterior, essencialmente pela pequena dimensão das empresas e pela falta de organização setorial. "O desafio de escala é de vital importância", frisa o presidente da Portugal Fresh, que aponta o ecossistema de fornecedores do Lidl como "um excelente exemplo de como a cadeia agroalimentar deve trabalhar". Gonçalo Santos Andrade participava no debate que seguiu a apresentação do estudo "Impacto das Exportações do Lidl na Economia Nacional", na quarta-feira, durante a Feira Nacional de Agricultura, em Santarém. Os dados divulgados revelam que as exportações por esta via, em 2021, tiveram um impacto de 219 milhões de euros na economia portuguesa.
O "exemplo" mencionado por Gonçalo Santos Andrade é a colaboração que a marca de retalho tem desenvolvido com os seus parceiros agroalimentares para escoar produtos através da rede europeia do Lidl. Dos 32 países onde está presente, os fornecedores nacionais conseguiram alcançar lojas em 29 mercados - as vendas representaram, no ano passado, 2% do total de mercadorias agroalimentares exportadas pelo país para a União Europeia (+23% do que em 2020).
A plataforma de compras da cadeia de supermercados serviu como "alavanca, em termos de exportações", para mais de uma centena de empresas portuguesas, destacou o responsável da área do Lidl Portugal, Bruno Pereira. O administrador de compras considera "extraordinário" o alcance geográfico conseguido, mas sobretudo o que significa em valor para as contas nacionais: por cada euro gasto em produtos exportados, o país encaixou 1,87 euros. Números que "demonstram que nos tempos de crise também há oportunidades".
Entre os produtos encaminhados para países como Espanha, França, Bélgica ou Alemanha, destaque para os 67 milhões de unidades de padaria e pastelaria (+31% do que em 2020) e as 400 toneladas de queijo (+164%). "O grande desafio no curto prazo é atingir os 32 países [em que a marca alemã está]", perspetiva Bruno Pereira.
Um trabalho elogiado por Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação de Agricultores Portugueses (CAP), enquanto critica a falta de estratégia do governo e de apoios públicos aos produtores nacionais, em contexto de guerra na Europa. E faz as contas à comparação com Espanha: o gasóleo agrícola custa aqui "mais 50 cêntimos por litro"; em 100 dias, a desvantagem chega a "30 mil euros por trator". Oliveira e Sousa lamenta ainda "a dificuldade de acesso" aos apoios estatais e defende a "simplificação administrativa", de forma que os agricultores possam crescer e internacionalizar-se.
Explosão nas vendas
Nisso mesmo tem ajudado o Lidl. E o impacto não se resume ao dinheiro injetado na economia, há ainda o contributo para o emprego. Segundo o estudo da KPMG, liderado pelo diretor Pedro Silva, foram criados 4568 postos de trabalho: 55% na agricultura, produção animal e caça; 27% na indústria de produtos alimentares; e 9% na pesca e aquacultura e setor das bebidas. "E falando com os fornecedores, 40% referem que aumentaram o número de colaboradores devido às exportações."
Também no programa Da Minha Terra, criado para promover os produtores portugueses locais, há casos de sucesso em que esta colaboração representou uma nova vida, em vez da falência. É o caso da Casa Paixão, produtora de queijadas de Serpa e popias e que pelo ecossistema do Lidl conseguiu aumentar a faturação em 400% em 2021. "Era um negócio familiar e estava prestes a fechar portas com a pandemia. Este programa fez-nos crescer", admite Ana Paixão, gerente e neta dos fundadores. Agora, "o céu é o limite" em consolidação e expansão, enquanto prepara a abertura de nova unidade de produção.
"Defendo que o processo de exportação para empresas portuguesas deve usar este modelo", concorda Jorge Capela, diretor comercial da Panike, um dos mais de 100 fornecedores do Lidl. Gonçalo Santos Andrade partilha a mesma visão e garante que a parceria entre a cadeia e a Portugal Fresh "permite ao setor de frutas, legumes e flores exportar para inúmeros países", mas realça: "As nossas relações com indústria e retalho só poderão ser de igualdade se a produção se organizar." Há que fazer "a distribuição do valor na cadeia alimentar justamente", diz, ainda que alerte que, para isso, é preciso "ganhar escala para negociar melhor" e "remunerar melhor a produção". Copiar o modelo espanhol, em que as cooperativas se juntam para ganhar poder de negociação, é um dos caminhos possíveis.