Nuno Lima Luz : "Sistema fiduciário tradicional é muito mais propenso a branquear verbas"

Nuno Lima Luz lidera a Associação Portuguesa de Blockchain e Criptomoedas (APBC) desde julho. O mandato vai até 2026, com o advogado especialista nas áreas de blockchain e ativos virtuais, telecomunicações, privacidade e proteção de dados a ter de encontrar pontes para consolidar a nova área do setor financeiro.
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Como retrata o setor português dos criptoativos?
O setor está num nível bastante bom, temos várias iniciativas de empresas nacionais e estrangeiras a desenvolver atividade em criptoativos a partir de Portugal, atraindo talento para o país - isto do lado da iniciativa privada. Há um contexto favorável, com muitas pessoas a mudarem-se para Portugal, e nesse aspeto o país é bastante atrativo. Por outro lado, não tem havido por parte do poder político uma grande motivação para desenvolver esta matéria. No anterior governo havia esse dossiê, mas o tema está efetivamente adormecido, pelo que não se sabe, para já, se existe vontade política para alavancar esta nova indústria.

Deveria ser estratégico?
Sim, consideramos que isto é uma matéria estratégica para o país e que deveria haver um tratamento mais cuidado por parte do governo. Percebo que o governo tenha imensas preocupações, até pelo atual contexto macroeconómico e geopolítico, mas o governo é composto por uma série de pessoas e esta pasta é importantíssima, porque permite criar um novo setor que também gera riqueza e não extrai grandes recursos do país. Poderia capitalizar o país, atrair mais talento qualificado, mais investimento estrangeiro.

O Estado está a perder a oportunidade de gerar mais riqueza?
Pode haver esse risco. Outros países já avançaram com modelos de tributação bastante atrativos sobre pessoas singulares. Em bom rigor, tudo o resto já é tributado, mas para qualquer outra forma de lucro nestas áreas, especialmente em IRC ou atividades empresariais de pessoas singulares, seria preciso alguma clareza e um standard para o futuro. Em bom rigor, até poderíamos avançar com uma antecipação ao MiCA [Regulamento de Mercados de Criptoativos Europeu], para desde já ir adaptando a legislação.

Como vê a relação da maioria dos bancos com as empresas de criptoativos registadas no Banco de Portugal?
Não sei o que se passa na cabeça das equipas de compliance dos bancos para tomarem a atitude que tomaram. Está a passar-se um bocadinho o que aconteceu com as fintech. Primeiro, têm uma atitude bastante cautelosa perante uma nova indústria - que neste caso até pode pôr em causa a banca tradicional. Com as fintech só mais tarde os bancos acompanharam a evolução, embora elas já assentassem num layer da banca. A criptoeconomia retira valor a esse circuito e os bancos não devem estar a saber lidar com isso. Mas isso só se for por falta de preparação. É uma questão de esclarecimento e formação nessa área. Existe um leque de oportunidades nesta área que os bancos podiam usar para o negócio.

E o governo deveria tomar a iniciativa?
O poder político poderia ter uma abordagem proativa, de maneira a criar alguma confiança também. Ou seja, trazer para a mesa todos os players e procurar um entendimento. Hoje em dia o sistema fiduciário tradicional é muito mais propenso a esconder ou dissimular algumas práticas criminosas e a branquear esses capitais ou a esconder a proveniência desses fundos do que a blockchain, onde estão alicerçados os criptoativos.

E os investidores portugueses estão recetivos à criptoeconomia?
Há uma grande franja da população que está interessada, mas ainda há muita desinformação. Estamos numa fase muito inicial e há muita necessidade de esclarecimento, para que todos possam crescer com ela.

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