Pontos de pressão e de oportunidade

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Vivemos numa era de rápida transição digital, em que novos paradigmas surgem constantemente. Por isso, é cada vez mais desafiante acompanhar o ritmo desta transformação. A instabilidade política e as pressões financeiras recentes de famílias e empresas condicionam o poderio económico das nações. Os conceitos e critérios que orbitam a responsabilidade social, ambiental e de governança têm vindo a tornar-se cada vez mais importantes enquanto diferenciadores e como prova de valor. Sobretudo quando estão direcionados ou se refletem na oferta final. Assim, a indústria seguradora não é exceção a esta regra. Ainda que a mudança esteja apenas a iniciar, estes pilares acarretam consigo desafios significativos; será o peso da transformação demasiado para um setor centenário?

As crescentes expectativas dos consumidores são o que considero ser o primeiro e principal desafio para o curto-prazo. O ambiente altamente competitivo, característico do setor segurador, tem-se intensificado ao longo dos últimos anos, em grande parte derivado de um maior e mais regular feedback, muito facilitado pelas ferramentas digitais ao dispor de quem quer contratar apólices de seguro. A ênfase, assim, recai na prestação personalizada de serviço aos clientes, conduzindo a um melhor uso do relato das experiências de utilização e para uma afinação e otimização das ofertas.

O cliente de hoje, na minha opinião, não procura um pacote de seguros que sabe que não usará; quer tirar dele partido a cem por cento. Assim, acredito que o papel reservado para os mediadores de seguros neste jogo de interesses será muito importante - através deles poderá estar a chave para uma melhor educação no que diz respeito aos novos riscos e realidades complexas que afetam as coberturas e prémios.

O segundo desafio prende-se precisamente com o ponto com que iniciei este artigo: o ambiente digital no qual vivemos. Num setor caracterizado frequentemente enquanto tradicional - e seja prova disso o facto de uma apólice para um seguro automóvel ter mais palavras que Os Lusíadas - urge, no desenfreio da revolução tecnológica a que assistimos, cortesia maioritária das disruptivas insurtechs, abandonar por completo os procedimentos em papel, obsoletos e prejudiciais ao meio ambiente.

Ao contrário do ambiente que temos que mandatoriamente proteger, o digital - e nós, que nele habitamos em parte - está mais que preparado para arcar com o peso burocrático inerente à nossa atividade. Não obstante, este é apenas o primeiro passo: simultaneamente, tornam-se aqui impreteríveis o investimento em cibersegurança e a implementação de requisitos regulatórios que protejam as partes envolvidas, desde a seguradora ao mediador e cliente.

Apesar disso, e embora este tipo de políticas sejam incontornavelmente benéficos para o meio ambiente, os números indicam que a falta de informação é, na verdade, o maior obstáculo para a sustentabilidade ambiental e a responsabilidade social por parte dos líderes empresariais: quatro em dez dos executivos afirmam que a inadequação dos dados que têm disponíveis impede a tomada de passos decididamente sustentáveis. A acrescentar, embora 95% das empresas revele ter objetivos ESG operacionais, apenas 10% puderam afirmar com certeza o registo de progressos relevantes no sentido de os atingir.

O que se coloca em cima da mesa é, assim, uma verdadeira espada de dois gumes. Se não temos informação para que possamos implementar medidas que vão ao encontro de stakeholders e público-alvo, como é suposto chegarmos até eles com essa prova de valor? Usemos a abundante tecnologia que podemos já ter ao nosso alcance - e um pouco de coragem - no nosso ofício. Simplifiquemos, procuremos desburocratizar e otimizemos. Afinal, é no desafio que se encontra a real oportunidade: a de nos reinventarmos.

João Valente, cofundador da MOVA Seguros

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