Redução do IRC para 17% até 2028 não agrada aos patrões. Querem taxa nos 15%

A CIP vai apresentar em breve “uma proposta estruturante” de reforma do IRC, numa altura em que as empresas reafirmam a pretensão de um desagravamento do IRC mais acentuado e mais rápido.
Descida do IRC não terá impactos positivos na economia se as empresas não reinvestirem a margem gerada pela baixa do imposto.
Descida do IRC não terá impactos positivos na economia se as empresas não reinvestirem a margem gerada pela baixa do imposto. Global Imagens
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A redução gradual da taxa do IRC até atingir 17% em 2028 conhece esta quinta-feira, 18 de setembro, uma nova etapa. A proposta do governo de reduzir a taxa geral para 19% em 2026, menos um ponto percentual face aos 20% em vigor, vai esta quinta-feira a votos no Parlamento. Na agenda, consta também a votação do alívio da taxa de IRC aplicável às pequenas e médias empresas (PME) e de pequena-média capitalização para os primeiros 50 mil euros de matéria coletável (primeira fatia dos lucros), dos atuais 16% para 15%. Para os patrões, o ritmo de descida do imposto sobre o rendimento das empresas está aquém do desejável, assim como a meta aprovada pelo executivo de Luís Montenegro.

O ritmo da redução da taxa geral de IRC deve “ser mais célere e com uma meta mais ambiciosa”, ou seja, “de 15% em vez de 17% como previsto pelo governo até 2028”, defende o presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP). Luís Miguel Ribeiro revela que no último inquérito realizado pela AEP junto dos associados, 95% dos inquiridos consideraram que a redução do IRC até aos 15% deve ser uma das principais prioridades do governo. O líder associativo admite, ainda assim, que a descida prevista “é um passo positivo”, mas lembra que no relatório International Competitiveness Index de 2024, da Tax Foundation, “Portugal surge como o segundo país menos competitivo em matéria de fiscalidade sobre as empresas, quer pela taxa de tributação como pela complexidade do sistema fiscal”.

O presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, é da opinião que a baixa proposta pelo governo “fica aquém do desejado pelos setores” que representa, defendendo que “o desejável seria uma descida de dois pontos” já em 2026. Face à decisão do executivo do PSD/AD, Vieira Lopes considera que a diminuição prevista deveria ser acompanhada por outras medidas, como a redução em 10% das tributações autónomas para todas as empresas, a limitação dos prazos para a devolução do IVA às empresas e a aplicação da taxa reduzida para as PME até aos primeiros 100 mil euros tributáveis, o dobro face ao teto proposto.

Luís Mira, secretário geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), também “preferia um ritmo de redução mais acentuado” do IRC. Não deixa, contudo, de sublinhar que “mais gradual do que o desejável, é obviamente uma medida que conta com o apoio da CAP, porque representa uma viragem na política de penalização aos lucros das empresas que vigorou por mais de uma década”. O líder dos agricultores portugueses realça que “a competitividade fiscal para as empresas é fundamental para a captação de investimento e, tão importante quanto reduzir, é dar estabilidade”. Em conclusão, “a redução tem de ser efetiva, consistente e duradoura para produzir os efeitos desejados e garantir que a economia portuguesa consegue competir com outras congéneres europeias”, defende.

Para Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal, “a medida é positiva”. Na sua opinião “é um bom avanço, caso realmente se concretize até 2028”.

Contas certas

Para o presidente da AEP, “o equilíbrio das contas públicas não colide com uma redução da carga e do esforço fiscais”, mas “a máquina do Estado tem de funcionar de forma mais eficiente e a economia tem de crescer a maior ritmo”. Para isso, “é necessária uma contenção da despesa corrente primária”, como já referido pelo governo, e um maior crescimento económico, que “só por si, gerará mais receita fiscal e compensará em parte a redução da taxa”, advoga.

Já Rafael Alves Rocha, diretor geral da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), adianta que ainda este mês será apresentado o resultado do trabalho da Unidade de Missão para Acompanhamento e Desenvolvimento do Programa Acelerar a Economia (UM-PACE), estrutura criada no âmbito do Acordo Tripartido sobre Valorização Salarial e Crescimento Económico 2025-2028, que incluirá “uma proposta estruturante de reforma do IRC”. A UM-PACE, estrutura coordenada pela CIP, tem como missão acompanhar e apresentar propostas para a valorização do programa do governo “Acelerar a Economia”, à luz das novas diretrizes europeias de aumento da competitividade, da produtividade e do investimento vertidas nos relatórios Draghi e Letta.

Em matéria de tributação sobre as empresas, Luís Miguel Ribeiro propõe a eliminação da derrama estadual e de taxas adicionais que, diz, desincentivam o crescimento das empresas. Também defende a redução da carga fiscal sobre o trabalho (IRS), pelo impacto no rendimento disponível das pessoas e na promoção e retenção de mão de obra. Como Luís Mira, lembra a importância da “garantia da previsibilidade fiscal”. Já Vieira Lopes aguarda que sejam anunciadas “novidades positivas” na reunião da Concertação Social de dia 24, “na qual o governo anunciou que iria clarificar a sua política fiscal, junto dos parceiros sociais”.

No ano passado, o anterior governo de Luís Montenegro quis descer a taxa de IRC em dois pontos percentuais, até chegar aos 15% em 2027. No entanto, para obter o apoio do PS no Orçamento do Estado para 2025, acabou por recuar na pretensão. O executivo propôs um desagravamento anual de um ponto e num período mais longo. Em 2024, passou de 21% para 20%, em vez dos 19% inicialmente pretendidos. Em julho, o Conselho de Ministros aprovou a descida em um ponto percentual por ano a partir de 2026, de forma a atingir a taxa de 17% em 2028. O custo estimado da medida, que também engloba a redução da taxa aplicável às PME nos primeiros 50 mil euros de matéria coletável, é de 300 milhões de euros por ano, ou seja, um total de 900 milhões.

Como compara a taxa de IRC cobrada em Portugal com o resto da UE?

De acordo com o Banco de Portugal, o país tem uma das maiores taxas nominais de IRC entre os países da OCDE, nos 31,5%. No entanto, a taxa nominal não dá a imagem mais precisa sobre a verdadeira carga fiscal aplicada às empresas, por não levar em consideração os benefícios fiscais, os incentivos e deduções de que usufruem, sobretudo a nível nacional. Por isso mesmo, a melhor forma de comparar a carga fiscal das empresas em vários países é a taxa efetiva de IRC. Os dados mais recentes do portal de impostos da Comissão Europeia indicam que a taxa efetiva de IRC aplicada a empresas não financeiras em Portugal é de 23,9%, a quinta mais alta dos 27, depois da Alemanha (29,7%) , de Espanha (25,7%), Malta (25,1%) e Luxemburgo (24,6%). Portugal, aliás, surge “empatado” com a Itália, nos 23,9%.

A taxa efetiva de IRC de Portugal está cinco pontos percentuais acima da média da UE a 27 (que se situa nos 18,9%. É também mais do dobro da taxa efetiva da Hungria (10,2%), da Polónia (12,2%) e quase o dobro da taxa efetiva da Irlanda (12,7%).

Um estudo do Instituto Mais Liberdade feito pelos economistas Juliano Ventura e Pedro Almeida Jorge e coordenado pelo diretor executivo do Instituto Mais Liberdade, André Pinção Lucas, dava conta que a redução de IRC poderia impulsionar a economia portuguesa e os salários.

“Seja relativamente aos encargos fiscais, seja relativamente aos custos de contexto, podemos afirmar que o sistema fiscal português é muito pouco competitivo no setor empresarial”, indica o estudo.

Já um trabalho do Banco de Portugal, também publicado em dezembro de 2024, coloca uma condição para que essa descida surta efeito na economia. Segundo o supervisor financeiro, um corte do IRC - o principal imposto cobrado às empresas - só terá efeitos positivos sobre a atividade económica se as empresas reinvestirem em si mesmas a poupança fiscal gerada pela descida da taxa de imposto.

Caso contrário, se os lucros adicionais forem retirados da empresa na forma de dividendos (que são distribuídos pelos acionistas), o efeito na economia será negativo. Isto porque um corte do IRC teria impacto na receita fiscal e o Estado teria de compensar essa perda de receita com o aumento de outros impostos, como o imposto sobre o rendimento individual (o IRS) ou os indiretos (como o IVA).

O DN questionou todos os grupos parlamentares sobre como vão votar a proposta da descida do IRC . PSD, IL, PAN, JPP e CDS mostraram-se favoráveis à aprovação , ainda que só os sociais-democratas, o PAN e JPP tenham sido taxativos a afirmar que votarão “sim”. O PCP adiantou que votará contra e o Livre mostrou-se contra a ideia da descida, mas sem explicitar como vai votar.

O DN questionou também o PS e o Chega, fundamentais para uma eventual aprovação ou rejeição da proposta, mas até à hora do fecho desta edição ambos os partidos não tinham ainda respondido. Em julho, o Chega afirmou que votaria favoravelmente a uma descida do IRC, mas sublinhou que entende que a taxa deveria chegar aos 15% até ao final da legislatura.

Com V.M.C

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