A TAP anunciou ontem lucros de 55,2 milhões de euros nos primeiros nove meses do ano. A boa notícia - ver a companhia aérea portuguesa a continuar a dar lucros - foi temperada com a informação de que este número representa uma quebra de 35,2% face ao mesmo período do ano passado. A TAP atribui esta descida a perdas registadas devido a depreciações cambiais nos primeiros trimestre, sobretudo do dólar. De facto, contando apenas o terceiro trimestre (e não as perdas de 70 milhões dos anteriores), a companhia lucrou 125,9 milhões de euros, mais 14,4% do que em julho, agosto e setembro de 2024.Aliás, no comunicado à imprensa, o CEO da TAP, Luís Rodrigues, destaca isso mesmo. Luís Rodrigues fala numa performance “sólida” no terceiro trimestre, “com aumento das receitas, impulsionadas por um contributo relevante da manutenção, resultados operacionais sólidos e um resultado líquido positivo que compensou integralmente as perdas no primeiro semestre”.Mas uma análise mais fina aponta outras pistas sobre a verdadeira performance da companhia aérea portuguesa, particularmente interessantes dado o momento estratégico que vive, no arranque de um processo de privatização de 49,9% do seu capital.Em declarações ao DN, no entanto, o especialista no setor da aviação Pedro Castro, analisa os principais problemas nas contas da TAP e identifica sintomas de possíveis doenças futuras. A começar pelo modelo de negócio da TAP, assente no “hub and spoke” de Lisboa. “Estes resultados são, uma vez mais, a prova de que o modelo de negócio “hub” é o errado para a TAP. (…) Num dos melhores trimestres para a aviação no hemisfério Norte, a TAP transportou mais passageiros e teve maior ocupação, algo que é positivo, porque a capacidade que acrescentou no mercado foi absorvida por ainda mais passageiros. Mas fê-lo com menos receita (uma queda de 5,4%) por passageiro por quilómetro voado (yield), ou seja, perdeu em rentabilidade, em margem operacional”, sintetizou o analista.E explica. “Entre 2024 e 2025, a grande aposta da capacidade da TAP virou-se para acréscimos no longo curso, com números recorde de voos e de destinos para a América do Norte e para o Brasil, para onde, em teoria, pode obter receitas mais elevadas”. Para Pedro Castro, essa teoria não se materializou em ganhos reais (apesar de um bom terceiro trimestre), algo que “poderá estar relacionado com a pressão do acionista Estado em prosseguir o modelo de negócio do “hub and spoke”.Este modelo usa a imagem de uma roda de bicicleta, em que o centro da roda é o aeroporto de Lisboa e os raios da roda são as ligações para outros destinos.Ou seja “privilegia-se mais os passageiros que apenas ‘saltam’ de um voo para outro do que o tráfego local de origem ou com destino a Portugal”. “Os passageiros ‘hub’ valem menos em termos de receita porque pagam menos para serem atraídos para um trajeto ‘via’ Lisboa em vez de outra coisa qualquer; e custam mais em termos operacionais devido às consequências das perdas de ligação quando um dos voos de ligação atrasa por meteorologia ou porque demoraram mais tempo na fila dos passaportes”, salienta Pedro Castro.O diagnóstico é claro. Para aumentar a sua receita unitária, a TAP teria de ter uma percentagem cada vez maior de passageiros cujo destino ou origem é Portugal. Ou seja, “teria de alargar a sua presença a outros aeroportos nacionais em vez de querer ser a ‘campeã’ do transporte de brasileiros ou americanos para a Europa, via Lisboa”.쩁O contexto futuro no longo curso também não se afigura positivo para o modelo seguido pela TAP, devido ao crescimento dos voos diretos a partir de Nova Iorque, São Paulo ou do Canadá. “Esta pressão concorrencial em termos de diversidade de rotas e de companhias será cada vez maior. É por isso importante a TAP estar cada vez mais ancorada no mercado local e estar menos dependente do mercado das conexões, que é mais volátil, mais sensível ao preço e que é operacionalmente mais desafiante”.Mas o modelo de negócio com o “hub” em Lisboa, algo que teve os seus ganhos no passado mas enfrenta desafios no futuro, tem sido uma das exigências do Governo no contexto da privatização, na qual os grupos IAG, Air France/KLM e Lufthansa já manifestaram interesse. .TAP com lucros de 55,2 milhões nos primeiros nove meses do ano